quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Os reis da casa miam





por Patrícia Santos Dumont pdumont@hojeemdia.com.br



Eles já foram renegados, usados como isca para exterminar roedores e, anos mais tarde, endeusados, encarados como verdadeiras divindades. Hoje, vêm derrubando estigmas e tabus. Tornaram-se os peludos queridinhos do Brasil. Em uma média de 1,9 animal nos lares onde dão o ar da graça, segundo o IBGE, os gatos estão, aos poucos, “roubando” o reinado dos cães e, definitivamente, conquistando os corações e lares brasileiros. 


Figura independente, econômica e quase autossuficiente, os bichanos parecem ter sido talhados para o século 21. Num mundo verticalizado e entulhado de cidadãos cada vez mais ocupados, cuidar de um cão pode parecer uma missão assustadora. Os felinos, por sua vez, são perfeitos para dividir os espaços compactos dos apartamentos modernos. 


Higiênicos e praticamente programados para usar a caixinha de areia, dispensam o luxo do banho no pet shop e o passeio na rua. Querem mesmo é um bom e demorado cafuné na cabeça. Só quando pedem.


Na casa da advogada e empresária Lívia Almeida Pinto, de 35 anos, Lui, Laila e Pantera, há tempos, jogaram por terra a fama de que seus parentes são interesseiros e antissociais. Primeiro a habitar o novo lar, Lui foi logo se tornando melhor amigo do schnauzer Chico, de 10 anos, que, até então, imperava sozinho no apartamento do bairro Buritis.


“Eles ficam soltos, todos juntos e nunca houve nenhum problema. Aliás, o Chico e o Lui se tornaram amigos desde o primeiro dia de convivência. Pantera só dorme comigo e Laila é um gato bem típico, mais na dela”, conta Lívia, que declara: “Amo cachorro, mas se tivesse que escolher outro bicho para adotar, hoje, seria um gato”.


A predileção tem motivo. Segundo a empresária, eles são tranquilos e equilibram o temperamento dela, agitada e impaciente. 





COMPANHEIROS – Quando Lívia adotou Lui, mal sabia que o gatinho se tornaria o melhor amigo do schnauzer Chico, de 10 anos; além dos dois, a empresária é "mãe" de Layla e Pantera






Quase um casamento



A empresária Ariadne Torquetti, de 46 anos, também não vê a vida sem uma figura peluda e fofinha em casa. Afinal, são 17 anos ao lado de Afonso, um presente do marido, Elton, com que está casada a mesma quantidade de tempo. Companheiro e extremamente sociável é como ela define o bichano, irmãos de outros três gatos, Ariel, 16 anos, Fidel, 10, e Toulouse, 6, e de Maria Clara, de 8 anos, filha única do casal. 







FAMÍLIA - Há 17 anos, Ariadne ganhou Afonso (gato cinza) do marido, Elton; depois dele vieram Fidel (preto), Toulouse (no colo da filha do casal, Maria Clara) e Ariel, que preferiu não sair na foto





Especialista em medicina felina e presidente da Academia Brasileira de Clínicos de Felinos, a veterinária Myrian Iser, proprietária da Gato Leão Dourado (primeira clínica especializada em gatos de BH), aponta a facilidade de criação como uma das principais justificativas para o crescimento da população de gatos domésticos. “Quem nunca gostou e passa a conviver, se apaixona”, diz. 


Dicas importantes para os ‘gateiros’ de primeira viagem


Apaixonar-se por um bichano e desejar ter um em casa é fácil, mas “gateiros” de primeira viagem precisam ficar de olho no manual da adoção. Preparar o ambiente que irá receber o gatinho e conhecer os principais hábitos e necessidades básicas dos felinos é fundamental para uma boa recepção. 

A dica número um da veterinária Myrian Iser é submeter o pet a um check-up completo que pode diagnosticar doenças muito prevalentes nesses animais, como Fiv e Felv – Aids e leucemia felinas, respectivamente –, ainda sem cura. Consultar um especialista também vai ajudar a planejar o calendário de vacinação e a castração, recomendada a partir dos 6 meses de vida.


Orelhas de gatos giram 180 graus para mapear os arredores. Eles escutam sons hiperagudos e identificam as ondas emitidas por morcegos


Disponibilizar fontes e recipientes com água e espalhá-los pela casa é outra forma de evitar problemas renais, aos quais eles são mais propensos. Nunca encha demais os pratinhos, assim fica mais fácil controlar a quantidade de líquido que está sendo ingerida ao longo do dia.


Para evitar acidentes, janelas e varandas e outros locais pelos quais os gatos possam fugir também devem ser protegidos com telas ou vidros. “O gato tem um instinto de caça muito aguçado e no ímpeto de caçar um passarinho ou borboleta pode cair. Esse traumatismo da queda pode ter consequências sérias e culminar na morte do animal”, alerta a especialista. 


Flávio Tavares




ESPECIALISTA - Myrian Iser é dona da Gato Leão Dourado, clínica veterinária, localizada em BH, onde somente gatos são atendidos; abandonado no local, Arthur virou o mascote da casa



Entretenimento


Gatos domésticos também devem ter à disposição muitos e variados tipos de brinquedos, que não só instigam o instinto selvagem, como servem de atividade física. Arranhadores, para afiar as garras, obstáculos altos e ambientes para descanso e esconderijo, como caixas de papelão, também são excelentes agrados. 


A veterinária Priscilla Freitas Santos Lacerda, responsável pela clínica de felinos da São Geraldo Clínica Veterinária, em BH, também aconselha atenção especial à oferta de água, comida e de caixas de areia, onde os felinos fazem xixi e cocô. “Se a pessoa tiver um gato, recomenda-se que ofereça duas caixas de areia, dois potes de água e dois de comida. Assim, eles ficam mais à vontade no ambiente onde vivem”.


Os bigodes dos felinos são sensíveis ao tato, direcionando a boca à presa, auxiliando na locomoção e indicando a largura de fendas


Donos de hábitos muito peculiares e extremamente fiéis a eles, gatos costumam rejeitar carinho na barriga, no rabo e nas patas. Também são avessos ao excesso de barulho, já que têm a audição muito mais desenvolvida do que a nossa e a de outros animais, e são sensíveis a cheiros – o olfato deles é o sentido mais importante. Gatos selvagens caçam usando o cheiro da presa: percebem onde passou e a esperam retornar. Eles têm nas narinas o dobro de células olfativas dos humanos.


Saiba mais


Um levantamento feito pela Euromonitor International dividiu o mundo entre países que gostam mais de gatos e os que preferem cães, mapeando as preferências com base no consumo de ração e nos cuidados dedicados aos pets. De acordo com a pesquisa, países ricos do Hemisfério Norte tendem a ter mais felinos, enquanto os do Sul criam mais cães, mais numerosos também na América Latina. No Brasil, são 52,2 milhões de cachorros (média de 1,8 por domicílio que tem pelo menos um cão), contra 22,1 milhões de gatos (cerca de 1,9 por casa onde moram felinos), conforme o IBGE. Na América Latina, dentre os 53 países avaliados, apenas a Guiana Francesa tem mais gatos. Os felinos também são preferência na Europa Ocidental, exceto em Portugal, na Espanha e na Irlanda. Na Suíça, na Áustria e na Turquia, por exemplo, são 3 gatos para cada cão.

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